quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

UMA ATITUDE OUSADA MAS RESPONSÁVEL...


Revendo "papelada antiga" fiquei surpreendido com o teor desta nota por mim enviada ao Comando da Defesa Marítima da Guiné em 1973.
A esta distância, assusta-me o seu conteúdo, pois ao fim e ao cabo tratava-se de uma comunicação entre um 1º. tenente (embora Comandante de uma Unidade) e um oficial general.
Quiçá ! Um pouco de arrogância sublimada pela "razão" e pela essência da "guerra".


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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

UM DIA DE EMOÇÕES...



16 de Março de 1974

“... ouve-se um estampido semelhante ao disparo de uma arma ligeira, seguido de gritos. FP alarmado, aponta para a minha coxa esquerda, onde no camuflado surge uma mancha de sangue.”


Hoje é – espero – o meu último dia, ao fim de um ano, no Chugué, um buraco ignoto na Guiné (Bissau). A montante do rio Cubijã, no limite até onde as lanchas de desembarque podem navegar.


Por ter sido promovido a Capitão-tenente, vou ser rendido.


Dentro de horas entrego o comando do Destacamento de Fuzileiros Especiais ao Oficial Imediato e regresso a Lisboa.
Levanto-me bem disposto. Capricho no barbear, duas passagens, pele “à cú de menino” (como dizia o Pedro Nunes, sargento-enfermeiro da “Sagres”). Visto nas calmas um fato de combate lavado e preparo-me para receber o camarada FP, o oficial nomeado pelo Comando da Defesa Marítima para o representar na cerimónia de “entrega de comando”. Veio de avião de Bissau para Cufar, local a jusante com uma pequena pista de aviação e instalações do Exército e, para o transportar para aqui numa viagem de cerca de quarenta e cinco minutos pelos meandros do rio, destaquei cinco botes de borracha com pessoal e armamento.



FP chega e é recebido cordialmente.
Habituado às comodidades de Bissau, alimentação regular e ar condicionado, longe da presença do inimigo, mostra sinais de intranquilidade e expressa o desejo de que a cerimónia decorra com brevidade, para que possa regressar rapidamente.

Dirigimo-nos para uma “parada” onde em tempos mandei enterrar na vertical um tronco aparado com uma adriça para içar a Bandeira Nacional. Fica situada em frente ao barracão central construído com chapas de zinco. O Destacamento aguarda-nos em formatura. Despeço-me de cada um dos homens com um abraço. Momento bem sentido esse, marcado pelas imagens dos bons e maus momentos vividos em conjunto. Por vezes, lágrimas mal contidas jorram soltas. O isolamento, o perigo, as provações, são a amálgama que robustece o cimento da camaradagem que perdurará para sempre.

Despedida consumada, há que meter os botes na água e rumar quanto antes a Cufar, sabido que é prática corrente o inimigo atacar ao fim da tarde com foguetões de 122 mm. A viagem decorre com apreensão mas sem incidentes. Olhando para a esteira de espuma branca que os botes de borracha provocam no rio, ocorre-me voltar para trás e reunir-me de novo àqueles homens que comigo partilharam as vicissitudes da guerra no último ano. Uma onda de culpa assalta o meu espírito, eles eram a minha família!
Chegados a Cufar, FP já menos tenso e eu, sentados num banco, a aguardar o transporte para Bissau, observamos a curta distância, a actividade de um pelotão de tropa indígena, uns de pé, outros sentados no chão de terra batida, que fazem vistoria ao armamento.

Eis senão quando, troa um estampido semelhante ao disparo de uma arma ligeira, seguido de gritos. FP alarmado, aponta para a minha coxa esquerda, onde no camuflado surge uma mancha de sangue. Baixo de imediato as calças. Com alívio, constato não estar ferido.

Junto ao banco, no chão, jaz um polegar sangrento. Um dos soldados negros contorce-se com dores.

Ele desenroscara o dispositivo central de uma granada defensiva, retirando o detonador e apenas este deflagrara, amputando-lhe um dedo. Tivesse a granada rebentado e decerto o nosso destino seria diferente, bem como o de outros homens ali estacionados.

O avião chega e nós embarcamos. Viajamos calados.

Revejo, como num filme, tudo o que se passou durante o ano que ali estive.

O insólito do acontecido no momento da partida, a iminência de desastre, a coincidência de ter sido eu o atingido por um fragmento humano. Penso no acaso, nos acontecimentos que nos surpreendem sem que deles sejamos cúmplices. No jogo da fortuna e do azar, a única coisa certa é que nenhum de nós pode compreendê-lo ou controlá-lo.

Penso na insustentável leveza do ser.

Alves de Jesus

terça-feira, 20 de setembro de 2011

TAMBÉM ESTIVE LÁ...



Foi com imenso prazer que tomei conhecimento do vosso blogue, promovido pelo Comandante Alves de Jesus, meu “amigo do peito” desde as camaratas e salas de estudo da Escola Naval (já la vão mais de 50 anos...).

Por coincidência também estive na Guiné de Agosto de 1973 até final da descolonização, 
em Agosto de 74, no comando da LFG NRP "Hidra” e só por acaso nunca nos cruzámos, pois 90% das minhas missões foram desempenhadas no Rio Cacheu. Mas também por isso tive notícias vossas, quer da curta estadia em Ganturé e da célebre missão em Maio de 73 de Binta para Guidage para apoio às nossas tropas lá sitiadas pelo PAIGC e já sem alimentos. Sei que foi  uma missão dura, muito dura.

De Ganturé  recordo o nome pitoresco mas real do aquartelamento do DFE1 – “Pensão do sono leve” que certamente serviu também de alojamento ao vosso DFE4.

Também sei da vossa missão no Chugué (Xugué) a partir de Maio; começou pela construção de  todo o vosso aquartelamento para a partir daí desenvolverem toda a vossa atividade operacional muito dirigida no rio Cumbijã, tarefas de grande dureza e em grande isolamento.

Desejo as maiores felicidades para todos vós e para o vosso Blogue
Um abraço do,
Cmdte Jaime Vieira Coelho  

terça-feira, 12 de julho de 2011

Cerimónia - HOMENAGEM AO FUZILEIRO - 2 de Julho de 2011


Realizou-se no passado dia 2 de Julho, no Barreiro, a inauguração de um monumento alusivo aos Fuzileiros, integrado nas comemorações dos 50 anos da Escola de Fuzileiros. Esta inauguração contou com as presenças de Sua Excelência o Presidente da República, Professor Aníbal Cavaco Silva, do Secretário de Estado Adjunto da Defesa Nacional, Dr. Paulo Braga Lino, do Presidente da Câmara Municipal do Barreiro, Carlos Humberto de Carvalho, do Chefe do Estado-Maior da Armada, Almirante José Saldanha Lopes, do Presidente da Associação de Fuzileiros, Comandante Lhano Preto e de individualidades militares e municipais.



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

POEMA AO FUZILEIRO


Poema enviado por correio electrónico pela Associação de Fuzileiros e da autoria de António Figueiredo (Sócio nº 2013)

Fuzileiro arrojado
Treinado para combater
Mas também para ajudar
Aqueles que estão a sofrer

Nas missões de guerra
Mas também nas de paz
Estás sempre pronto
Sem olhares para trás

És alegre e destemido
Tens assaz preparação
Estás muito habilitado
A cumprir a tua missão

Foste sempre forte e valente
Desde tempos que já lá vão
Quando te dão uma ordem
A acatas com gratidão

Lembramos a guerra em África
Onde foste sempre temido
Combateste o inimigo
E levaste-o de vencido

Quer estejas onde estiveres
Como tu não há igual
Elevas sempre bem alto
O nome de Portugal

Escolheste ser fuzileiro
E assim continuarás a ser
Seja qual for a condição
Assim vais permanecer

Fuzileiro da Marinha
Quer em terra quer no mar
Teu apanágio é vencer
E o teu nome honrar

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

DESABAFO !


Anos depois de terminada a comissão de serviço na Guiné fui descobrir nos meus arquivos um email oportunamente enviado a um Coronel amigo e cujo texto não é mais do que um desabafo sobre a justeza das missões atribuídas aos Fuzileiros Especiais:

"Caro amigo 

Já há algum tempo que gostaria de saber a tua opinião sobre o seguinte:
Na Guiné operaram "pára-quedistas", "comandos" e "fuzileiros especiais". 
Apercebi-me que muitas vezes os "fuzileiros" desempenharam acções de quadrícula e integrados em unidades (COP e CAOP e BCAÇ's) chefiadas por oficiais do exército.
Sem menosprezo destas chefias com as quais sempre travei relações de amizade e sã camaradagem, a verdade é que a especialização em "fuzileiro especial" dos DFE's não era considerada pelo enquadramento de comando.
Estas chefias, na sua maior parte, desconheciam as verdadeiras características dos "fuzileiros especiais", ou seja como foram formados, como estavam organizados, etc.
Julgo que o mesmo já se não passava com os pára-quedistas, até porque estes nunca estiveram sediados no mato. (Voltavam a Bissau/arredores).
Passei um mês em Ganturé e cerca de um ano no Chugué (cujo aquartelamento foi construído por nós "tropa especial" em simultâneo com a actividade operacional).
Tudo isto faz-me agora pensar que o Spínola e os seus seguidores próximos desprezaram a verdadeira razão da existência de fuzileiros naquele teatro de operações. E, o que é grave, com a complacência dos responsáveis da Marinha em Bissau.
Tive a felicidade de ter no CAOP 1 (Cufar - Cor. Pára Leitão), mas já no COP 3 estava o Ten. Cor. Correia de Campos que, verdade se diga era um excelente combatente, mas sem a mesma sensibilidade para a tropa especial.
Olhando para trás constato que a finalidade para a qual as unidades eram preparadas foi frequentemente desvirtuada."

Um abraço do
Alves de Jesus